terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

PARA MORENOS, MORENAS-CLARAS, CHOCOLATES, CABROCHAS & CRIOULAS!



Se João Balula estivesse vivo corporalmente o que ele teria feito nesses últimos três anos? Pergunta sem resposta. Pois hoje completa três anos que ele se mudou pro andar de cima. João Carvalho da Silva, vulgo João Balula, foi-se daqui mas deixou muitos amigos e admiradores. Eu tive o privilégio de usufruir da sua presença e amizade. Onde ele estiver, aceite a nossa mais irrestrita saudade e admiração. Salve Balula! 

Posto aqui um dos inúmeros textos que ele me enviava para postar no Livre Pensar, com um recado provocativo e debochado: 'meu irmão Ivaldo, divulgue ai pro mundo todo ficar sabendo que a gente tá sabendo de toda essa safadeza por aqui'. Leia o texto abaixo e você vai ter uma pequena idéia de quem era esse Anjo Negro, que esse ano será homenageado numa justa homenagem do Bloco Anjo Azul no Folia de Rua. 
Curta Balula e suas inquietações, provocações. Num texto que o título diz tudo.



PARA MORENOS, MORENAS-CLARAS, CHOCOLATES, CABROCHAS & CRIOULAS! 

Por:
JOÃO BALULA.


Não há lugar para o negro ou pra negra que “não se enxerga”, nesta sociedade!
Não há espaço praqueles(as) que SÃO NEGROS(AS), mas que teimam ( fingem! ) em não se reconhecer(-se) prontamente negros(as) que são!
Não existe oportunidade alguma para quem somente se nega, se menospreza, se diminui, se aniquila e se destesta, naquilo que é – ninguém consegue gostar de quem de si mesmo sente desprezo!
Não restam chances para “morenos”, “jabiticabas”, “macacos”, “tições”, “escurinhas”, “pardos”, “marrom-bombom”, “morenas-claras”, “mulatas”, “tonéis-de-piche”... Também não existem privilégios para negros(as) que se omitem de se afirmar como Indivíduos Negros!...
Ninguém gosta de gente que não gosta de se assumir, naquilo que realmente ( se nota que ) é – todas as Sociedades funcionam mais-ou-menos assim!!!

Nas castas chino-japonesas, por exemplo, há um controle muito rígido daquilo que se é. Exíge-se, dentre questões-do-sangue, que se domine à língua falada no grupo, sua cultura particular e a ritualística filosofal ( religiosidade ) praticada em coletividade, como fatores Inalienáveis de preservação dos esteios-pilares daquele grupo. Dizem – em bocas-miúdas – que os Amarelos ( orientais ) são “umas pestes!”. Mas também concordam que “são muito inteligentes, inventivos e unidos”...

Já nas aldeias indígenas mais centradas, por exemplo, poderemos identificar os mesmos parâmetros de convivência coletiva que se apresentam-nos os Amarelos, como também os Ciganos: devido à compressão de fatores externos, via de regra, esse modo-de-viver se nos parece revestido de uma grande desconfiança para com os visitantes não-Índios e com uma verdadeira fobia em relação às pessoas de pele-branca ( mesmo quando em se tratando de nascidos-criados de relacionamento inter-racial – índios com outros ).

Para a grande maioria dos brancos, mesmo no Brasil, onde se insiste em apregoar o mito ( criado & mantido ) da “democracia racial” ( que sugere e aposta em “todas as raças convivendo sob iguais condições e com os mesmos deveres e direitos” ), os negros simbolizam ( imaginário ) um perigo-constante, como “uma bomba-relógio, alí parada, angustiosamente nos obrigando a contar as horas”... No Brasil a realidade nos adverte a todo instante que “os negros que se mantenham distantes de nós – quietinhos e na sua!”. Conforme até certos livros-escolares “... eles vieram, foram, passaram, trabalharam, sofreram; dançavam, cantavam, jogavam, fugiam, matavam, moiam...” – no todo da literatura escolar, faz-aparecer propósitos de incutir uma “memória-de-passado” aos nossos Estudantes e isto, faz-parecer oficial, aos brancos, que lhes está facultada uma hegemonia e um domínio de suas castas sobre as Etnias Indígena, Negra e Cigana.

Os ciganos, por sua vez, se auto-defendem engendrando códigos-secretos e extremamente punitíveis aos seus páres-infratores para assegurar-se como Povo, nesta sociedade de conflitos raciais surdos ( velados! ) e mudos! Para seus Clãs ( tradicionais em maioria ) um Guappo é um elemento-desagregador, porque, “ao misturar-se com outras raças poderá provocar a destruição do elementar” – o jeito-cigano-de-viver. Já um Mirtho deverá ser castigado com o Degredo sumário, “pelo atrevimento de negar aos seus, à sua gente e à sua cultura/tradição”, exceto no caso de possuir Elemental Preponderante – dádiva dos considerados escolhidos pelas suas Divindades ( razões do Imaterial cigano ).

Pelo que percebemos, toda Comunidade tem suas leis, seu sistema de projeção e proteção do Ato de Vida em coletivo, sua ética e sua estética próprias, aplicadas ao cotidiano-particular de cada grupo social.

Evidentemente que os Negros também detêm um seu Sistema Cultural de labuta no dia a dia...
Mas nós, os negros brasileiros, ainda não conseguimos constituir ou construir uma ética ou uma estética de Povo Negro. Há muitas “aspirações em movimentos”, existem muitos desejos alinhavados, mas ainda escondidos... Até pregamos sobre uma comunidade negra, no entanto, desconhecemos aspectos-principais motivadores de ideais e/ou aglutinadores de adéptos, que nos garanta “povo” – e o Povo Negro – ainda distante – é a nossa doce-falácia e a nossa oressiva des-constatação do óbvio!

Ninguém gosta de gente que passa ( as vezes até ) toda a ( sua ) Vida tentando ser aquilo que realmente não é... Realmente, é duro encarar de-frente a alguém que somente quer SER NADA!

Consideremos, mesmo em tom de brincadeira, a princípio, enchermos às delegacias e tribunais de pequenas causas de queixas ao suposto crime de “racismo-às-avessas” que é tratar Negros e Negras por “coisas” como “morenos(as)”, “crioulas(os)”, “pretos(as)”, “marrons”, “sangue-bom”, “mulatas(os)” e muitos outros Impropérios desta natureza... Obriguemos – judicialmente, até! – a que passem a nos tratar simplesmente por NEGROS(AS) ( já que quando “se afetam”, todos e todas, imediatamente nos reconhecem e nos qualificam pelo que somos – apesar dos lamentáveis adjetivos, tipo: NEGRO-besta, NEGRA-fuleira, NEGRO-safado, NEGRA-vadia, NEGRO-burro, NEGRA-ladra-ladrona... ).
Presumamos ( já que tem o NEGRO-presunçoso! ) que todos & todas já tenham consciência de que somos NEGROS(AS)! Por que não exigirmos a nossa Visibilidade pública? Coisas, como: Respeito, Consideração... Dignidade ? Ter a dignidade restaurada, certamente provoca e promove Auto-Estima... Todos os Povos têm certeza disso!

Sabemos que, no caminho-sem-compostela dos Indivíduos Negros tem ráptos-de-África, separação-de-familiares-tronco, estrupos-de-jovens-crianças-adultos e velhos, mutilhações em praça-pública, assassinatos-deliberados, subjugação-sumária-unilateral, inferiorização-de-consciências, humilhações, humilhações, humilhações... aos milhares de momentos... advindos e introjetados de um processo de escravização que per-durou ( quase ) quatrocentos anos, e de uma abolição que foi inventada “às pressas”, pros brancos “virarem o jogo” contra a gente.
Isto, toda mulher, criança e homem negros sente-na-pele a toda hora que se estar ( acordado/a ) neste imenso país ... Mas, isto e mais outras danaceiras-brancas, não poderá ter peso-de-desculpa para ( essa ) tanta falta de Estima e/ou Auto-Estima que se esvai em lágrimas do rosto-negro da atualidade... Afinal, eu, você, e até o meu gatinho-preto-de-estimação, já sabemos que “esse jeito branco de negro ser” tem essa finalidade: controlar a “liberdade que nos deram”, manter “os negros-salientes sob vigilância e rédeas-curtas”, não nos permitir “arroubos-de-felicidade” alguma – debelar à resistência “dos poucos atrevidos e ousados” e “nivelar o moral” ( cognitivo ) da População para estar sempre-alerta contra nós!

Os “degradantes índices de miséria dos negros”, conforme a espetada-ministerial, servem muito bem para ilustrar trabalhos-escolares, monografias, teses, falas-bonitas em reuniões do movimento-popular, e agora, para “matérias-politicamente-corretas e atualizadas” de meios de comunicação de ( des )massa... Por que também não haver pérolas-ministeriais praquilo de Oxum ( ouro/beleza! ) que existe sendo tocado ou feito pela nossa Imaginação, em Comunidades? Segundo o comercial: “você não acha, que já está na hora de re-ver seus conceitos?”...
É engraçado – mas tá longe de tornar-se uma Graça: a “newacademy” re-edita os seus postulados de desgraça-plena-e-sumária pros negros, e é a gente que tem que endoidar “pra acumular dados em PC’s, cartilhas e laptop’s e ainda tê-los na ponta da língua, pra qualquer discurso, como se isto fosse de ultra-serventia na concecussão de Políticas Públicas, por exemplo.”. Ou mesmo na preservação dos rios, matas, oceanos ou das baleias... É tudo cultura-branca meio ao alcance de negros, índios, ciganos, amarelos e outras cores ( etnias ). E os que cairem-dessa-rede é porque eram “peixes-inteligentes” ( viraram não-estatística ) – escaparam arranhados, da mesmice!!!
Os “Excelentes” adoram nos dar ( sempre! ) mais trabalho – desde há Suméria que é assim...

Por que “os negros não gostam de si”?
Nesta “abstração-nfantil”, de uma estudante pessoense de quarta série, ainda em 2003, numa escola-particular das ditas de classe-média, descobrimos coletivamente que nesse “pensamento-evasivo & efusivo” adormecem e acordam milhões de negros e negras ( 83% ) da população do Brasil ( somando-se “tudo”! ) – que “se orgulha” de estar “o segundo pais mais-negro no mundo” – e onde também temos uma militância etno-racial-negra que expressa em claras-mentes que “há uma imensa dificuldade de manusear o discurso e a prática de conversas, princípios, jeitos, formas, conceitos, filosofias, ciência, arte e religiosidade NEGRAS nas comunidades onde atuamos!”. É verdade: não é fácil ser negro(a), no Brasil. Mas, e daí: nunca foi fácil estar negro(a) em lugar algum do mundo!

Naturalmente que preferiremos os pejorativos: moreno(a), mulata(o), crioulo(a), escurinho(a), bróda, mano(a), bléque, xará, da-cor, meu-rei, sangue-bom, chocolate, acerola e/ou laranjinha... Nosso gosto é mais por “coisas” que não nos coloquem em-pé-de-guerra ( ou mesmo de conflito ) com o status-quó ou com a manutenção ( inalterada ) do racismo à-brasillien. Sem falar que nossa altamente decantada Afrodescendência – tentativa de nos traduzir light – vem tornando-se a mais recente “piada de bacharel”. Explicou-nos um cientista-social, no horário-nobre, que “... negro pesa, fere, arranha na cabeça, incomoda ao gosto-elítico, pseudo-dominante; sugere, tal terminologia, “algo-de-ruím”, até mesmo para as conversas dentre pobres. Então, a intelectualidade gerou “um termo aceitável”, que também não despersonaliza o caráter da questão, tudo se tentando evitar algumas brigas – copiou-se o Afrodescendente!”...
Bravos!!! Fiiiiiiiiiiuuuuuuuuuu!!!!

Já falei por aí que “isto” parece muito mais ‘remédio-pra-sexo’, dos ruins e de laboratório estrangeiro ( droga! ): um caso-crasso de Ingerência à intelectualidade brasileira ( ou uma conveniente Aderência dos intelectuais-tupiniquins ) – quem sabe o que seria o Pior?

Termina por ninguém gostar ( de vera ) da gente, já que inventamos um monte de subterfúgios para neutralizar que nos visibilizem enquanto NEGRO ou NEGRA. Ficamos, certamente, constrangidos(as) quando nos detratam por “morenos(as)” nos lugares públicos ou nas portas de privadas, porém, “a gente ainda não concatenou ( possui ) um discurso ante as teorias da nossa Morenidade”, como fala um intelectual-de-prateleira ( auto-definição ), amigo meu.
Fatalmente, está adiado mais um embate com forças e recursos para modificar a invisibilidade negra  de ( sendo básico ) pelo menos uns setenta e cinco ( 75% ) por cento do nosso povo ( a cada dez negros somente dois vírgula cinco “acham-se” negros ou negras – e mais da metade desse percentual não souberam explicar “porque”. Também com uma ajudazinha da televisão, a Academia anda cerrando-fogo na “re-constituição de uma única raça – a Raça Humana, SE existir raças” ( ela tem dúvidas?! ). Quer dizer, que elas ( as raças! ) “eram perfeitamente aceitáveis na sociedade de 1.100, do século doze cristão”, somente porque “os caras” tinham interesses geocêntricos-políticos-econômicos de ampliar domínios além-mares, confiscar riquezas e patrimônios alheios e/ou transformar em “peças de mercado” Africamos, para aumentar suas fortunas pessoais e/ou coletivas, era isso, então? E que hoje em dia, somente por que “todos nós viramos consumidores-potenciais”, revoguem-se ( danem-se! ) as opiniões em contrário, arraigadas nas cabeças dos Povos, também é isto? Ou será que as Escolas não conseguiram escapar da cooptação, para ensinar ao Povo que ele deverá abrir os olhos e recusar-se a ser massa-de-manobra?
Companheira(o): conclua, seu tempo acabou!!!

Ninguém vai gostar – ou dá-trela! – pra quem se comporta conivente ou se locumpleta cabisbaixo(a) das idéias e dos ideais da morte de si-mesmo. Todo mundo quer, deseja e rala-duro pra Morrer-Feliz: tEr o senso-do-dever-cumprido é o nosso Galardão. Possuir riquezas e acumular patrimônio ostensivo, isto já é outra discussão!

Naturalmente morenos(as), escuros(as), pardos(as), pretinhos(as), crioulos(as), mulatos(as) e mais de cento e quarenta e sete “codinomes de negro/a” ( a disposição no IBGE ) não progredirão em suas expectativas pessoais... girarão mais no drama do “negro-que-se-dá-bem-por-enquanto”... Se colocarão ( inquestionavelmente e institivamente, até! ) contrários às aspirações do conjunto “dos seus” – talvez, nunca se neguem, se encostados à parede, porém, já é franco-fato que renegarão aos outros ( “já feitos Negros/as” ) por infinitas vezes...
Ninguém deverá “se abalar” ( no sentido da nossa Tradição Ancestral Africana ): se todos e todas fóssemos IGUAIS, todo o Universo seria “a maior merda!”... Ademais, a AUTO-NEGAÇÃO ( dizem Abnegação ) também está na Égide do Destino. Já que Ifá anda “meio-gongado” entre nós, as Águas serão obrigadas a continuar rolando... ( a despeito e sobre a sede de São Paulo ou do Sertão da Paraíba ) – e poderá ser que não sobre Pedra sobre pedra!

Não há lugar para o negro ou pra negra que “não se enxerga”, nesta sociedade!
Não há espaço praqueles(as) que SÃO NEGROS(AS), mas que teimam ( fingem! ) em não se reconhecer(-se) prontamente negros(as) que são!
Não existe oportunidade alguma para quem somente se nega, se menospreza, se diminui, se aniquila e se destesta, naquilo que é – ninguém consegue gostar de quem de si mesmo sente desprezo!
Não restam chances para “morenos”, “jabiticabas”, “macacos”, “tições”, “escurinhas”, “pardos”, “marrom-bombom”, “morenas-claras”, “mulatas”, “tonéis-de-piche”... Também não existem privilégios para negros(as) que se omitem de se afirmar como Indivíduos Negros!...
Ninguém gosta de gente que não gosta de se assumir, naquilo que realmente ( se nota que ) é – todas as Sociedades funcionam mais-ou-menos assim!!!

Nosso DNA – de Negro(a) – sabe, percebe e sente: desde os primeiros-homens, quando já se escreveu(-se) – no nosso Sangue – tudo, sobre isto!
Calma: “a Felicidade, haverá de existir ( e resistir ) por sobre toda a Adversidade!”, já nos assegurou um Poeta.

Atoto-oni’orisha.
__________________________________________________________________________
JOÃO BALULA -  é homem-negro, militante no Movimento Negro paraibano, desde 1980.



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Diga o que quiser, mas diga.