sexta-feira, 13 de agosto de 2010

Sobre o Ceticismo

Fonte: Estevam Dedalus [estevam_dedalus@yahoo.com.br]




Estevam Dedalus


O método científico possui um ingrediente cético que pode ser bastante útil. Ele recomenda a suspensão de valores e a procura por provas cabais, livres de preconceitos, firmadas experimentalmente. Essa visão choca-se com o princípio de autoridade e crenças sustentadas pelos costumes. O conhecimento científico está associado ao reconhecimento, por especialistas de determinado campo, à apresentação de provas racionais e a um conjunto minucioso de processos empíricos. Apesar disso os cientistas não estão imunes a modismos intelectuais e ao respeito reverencial a companheiros ilustres – o que geralmente costuma produzir efeitos negativos sobre a criatividade.

Nem sempre quando nos deparamos com novas ideias estamos em condições de bem avaliá-las. O deslumbramento em seu aspecto negativo conduz à veneração servil, gerando indivíduos submissos à idolatria e suscetíveis à crença cega na autoridade. É causa de profundo fanatismo. Por outro lado, quando bem empregado, torna-se fonte de motivação e enlevamento. O astrônomo que pela primeira vez atine para a vastidão do universo e mire na possibilidade de existir outros seres vivos inteligentes, terá tais sentimentos. Quantas coisas desconhecidas parecem surpreendentes, encantam ou provocam medo quando observadas pela primeira vez? Muitas teorias e doutrinas que em épocas passadas foram consideradas verdades insofismáveis, obras cerzidas com o melhor elã de nossa civilização, posteriormente perderam a validade.

Na vida cotidiana, o ceticismo pode ajudar a nos proteger de trapaceiros, políticos demagogos e toda a sorte de pessoas mentirosas ou mal intencionadas; servir de antídoto contra superstições e preconceitos; diminuir a força na crença dogmática através do fortalecimento do diálogo racional. Fico imaginando que se o espírito cético contagiasse violentamente o leitor, ele acabaria colocando em xeque tudo o que foi dito até aqui. E que talvez duvidasse da própria capacidade de duvidar ou até mesmo de sua existência – estas últimas questões são demasiadamente filosóficas e desimportantes quando encaradas de um ponto de vista prático. Pessoas comuns considerariam isso um sinal de loucura.

Por essas e outras advogo o ceticismo moderado, que não impeça a ação. Evitamos assim cair numa cadeia infinita de dúvida que, se universalizada, paralisaria toda a sociedade. Caso contrário podemos supor um cenário caótico em que juízes, dominados pela incerteza, não desempenhariam adequadamente suas funções nos tribunais. Os médicos não operariam, devido à impossibilidade de escolha racional. Seria o fim do comércio. Prisões. Escolas. Fábricas. Arte, ciência e política. De qualquer vestígio de realidade. A completa paralisia, naturalmente, acarretaria em morte generalizada por inanição.

Evidente que tudo isso não passa de devaneios. Sendo assim, coloquemos de lado a imaginação e não nos esqueçamos de reconhecer o valor do ceticismo quando aplicado com sabedoria e moderação.


Sociólogo.

Um comentário:

  1. Quem, contemplando o cenário com seriedade, não estiver cético, certamente está alienado.

    A coisa não para está para otimismo.

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